Filosofia X Ciência
 



Cronicas

Filosofia X Ciência

Paulo Cimirro


Nos períodos que antecederam a Cristo, a Filosofia foi a única ciência a abordar um tema que até hoje traz angústias ao ser humano: De onde viemos? Por que viemos? E para onde iremos?

Sócrates, Platão, Aristóteles e outros filósofos da época, pensavam ainda sem o profundo ranço teísta da Idade Média e, usando apenas a percepção como instrumento, desenvolveram teorias que ainda hoje, mais dois mil anos depois, intriga pela consistência e fidelidade ao que a ciência moderna comprova como real. Era livre o sonho, o debate e a expressão de ideias. Pioneiros na arte de desvendar o espírito, deixaram as mais lindas lições a colorir o imaginário de nossas vidas.

Com a queda do Império Romano, por volta do século X, o ocidente, desorganizado administrativamente, viu na Igreja Católica a única instituição capaz de ocupar aquele espaço deixado pelos romanos. Daí para frente começou a Igreja a ter profunda influência nos governos, na sociedade e no cidadão. Foi a maior força moral da época, moldando a alma do homem. Mas foi também a força mais terrível a cercear a capacidade de sonhar do ser humano. A Ciência, que recém engatinhava, reivindicava os direitos da razão. Fica claro que estas reivindicações eram muita tímidas, até porque, quem mais ousasse desafiar os dogmas cristãos era, literalmente, queimado.

Mesmo os filósofos da época que tinham o dom do pensar e a responsabilidade de despertar a alma do ser humano em busca da verdade, misturavam filosofia com religião. Uns influenciados pela formação religiosa, outros para manter a cabeça no lugar. Mesmo Spinoza, o mais suave dos filósofos, que era judeu, projeta sua imaginação estudando a natureza de Deus e a vida do homem.

Mas nem a força dos grilhões pode impedir o homem de sonhar. E muitos homens sonharam e, com coragem, romperam seculares cadeias de obscurantismo e deram bases indiscutíveis ao espírito humano.

A partir do século XVI, a ciência, agnóstica por princípio e materialista nos seus fins, já livre dos tentáculos da igreja, se desenvolve com incrível rapidez, forma uma indestrutível base intelectual, renova a face do mundo e traz ao homem moderno incríveis benefícios pessoais e coletivos.

A Igreja rendida perante tantas objeções da ciência, se queda em seus dogmas, opõe a fé à razão como mandamento indiscutível e nela encerra as discussões.

Mesmo com o rolar do tempo, tecendo uma formidável teia de descobrimentos, a ciência ainda não consegue dar ao homem respostas de questões milenares. Hoje, a ciência sem esperanças e a religião sem provas, convivem separadamente, desafiando-se, mas sem se poderem vencer.

A dúvida milenar ainda persiste e, para a ciência tradicional, as respostas tanto podem estar sob a terra como nos céus. Enquanto o Arqueólogo cava e o Astrônomo bisbilhota o céu, nenhum indício realmente concreto de como e porque o homem está aqui, aparece.

Mas como entender o passado e projetar o futuro se não conseguimos nem desvendar os mistérios do presente. Se a ciência tradicional, com toda a tecnologia disponível não conseguiu ainda aprofundar-se nos mistérios da mente, desconhecendo mais de cinquenta por cento do poder que encerra um cérebro humano, que conhece e reconhece apenas cinco sentidos, que mapeou circunvoluções, neurônios, axônios e sinapses sem ter muita certeza de como se expressa as interligações disso tudo.

Mas porque acreditamos ser a Filosofia a ciência capaz de dar ao homem as respostas que ele tanto procura. Sem o poder mágico da religião e sem a razão fria da Física ou da Astronomia, a Filosofia navega por espaços que só podem ser percorridos pela imaginação, livre como o sonho e sem fronteiras como o vento. Só o debate filosófico pode, em busca da verdade, percorrer inclusive os caminhos da utopia. Assim como as notas erradas de uma sinfonia são importantes até que se encontre o tom adequado para a harmonia do conjunto, as correntes teóricas aparecem até que a contraprova da verdade seja dada pelo fato de outros observadores, empregando linhas de raciocínio deferentes, cheguem aos mesmos resultados.

Por que o Filósofo se diferencia dos outros? Pela habilidade em compreender o homem e o mundo que o abriga, recolhendo os cacos de verdade, polindo-os e montando o espelho que reflete o espírito humano. Só a filosofia pode dar ao homem a integral noção de sua complexidade e estabelecer o sentido que ocupa no espaço e no tempo. Quando o homem tiver o conhecimento total de suas potencialidades, quando tiver noção integral do que é, poderá entender por que veio e o que representa a sua permanência neste mundo e, neste momento, encontrará forma de projetar-se ao futuro respondendo para onde irá.

Paulo Henriqson Cimirro é médico e participa do Curso Online de Formação de Escritores.

 

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